GRATUS ESSE

"A gratidão é um fruto de grande cultura; não se encontra entre gente vulgar. "

Johnson, Samuel.

Gratidão, s. f. Reconhecimento por um benefício que se recebeu; agradecimento; qualidade de quem é grato.

in, Diccionário.

A quem cabe usufruir este sentimento?

A mim e a ti; a nós e a vós; a eles.

Porquê?

Simples... A minha sobrinha tem um ano e meio e já lhe começaram a ensinar que quando alguém lhe dá algo:

-"O que é que se diz, Diana?", ao que a menina responde num dialecto que ainda agora principiei a compreender:

-"bigado".

É este um sentimento que se perde com a idade e o crescimento fisíco e intelectual? Ou é ele uma forma de expressão que empregamos porque caso contrário seríamos apelidados de mal-educados ou indelicados: quem sabe mesmo ingratos?!

E deve esta demonstração de gratidão ser uma mera formalidade de expressão oral cumprida por puro exercício do protocolo social, ou será que é um sentimento que deveríamos cultivar no quotidiano, de dentro para fora?

Afinal, gostamos de estar gratos?

Quando alguém nos dá a mão e nos ajuda a erguer de novo, sentimo-nos pessoas melhores porque percebemos que alguém gosta nós? Ou será que nos ficamos a sentir em dívida, quase como que: -"Tenho que saldar esta dívida porque não quero dever nada a niguém. O mais depressa possível!"

Será que é quando o Sr. Agente nos diz: -"Então vá siga lá mas não se esqueça de por o cinto!". É aqui que nos sentimos realmente gratos; afinal ele poupo-nos de perder 120€ e assim já podemos fazer uma extravagânciazinha...

Eu, por mim, estou grato: ao Sr. Policía, á Sra da bomba de combustível que me avisa que a bomba está em pré-pagamento num tom de alerta porque já estou há uns largos dois minutos a olhar para o contador e para ela á espera que ela autorize o reabastecimento, ao Sr. Barata do Pavilhão da Secil porque nos perdoa todos os meses não termos o pagamento em ordem, aos meus amigos pelos bons e pelos maus momentos que passei com eles, aos caríssimos, excelentíssimos, magníficos, elevadíssimos, suas eminências - os meus pais - por tudo o que fizeram e por aquilo que ainda irão fazer por mim - "É assim que eu aprendo, desculpem!" - ás minhas manas que maravilhosas são e sempre prontas para me ouvir e aturar as minhas más disposições e maus humores, aos meus cunhados pelo amor que nutrem e vão continuar a nutrir pelas minhas manas e por mim, aos meus colegas de trabalho pelos ensinamentos que me tentam fazer chegar, ás minhas ex-namoradas por tudo o que me ensinaram e por tudo o que vivemos juntos, fossem eles bons ou maus momentos foi bom passá-los convosco, aos meus avós os que ainda cá estão como o meu querido avô que já partiu - ESTARÁS SEMPRE COMIGO - por tudo o que me ensinaram, em suma, agradeço a todos, simplesmente, por fazerem parte da minha vida.

A gratidão cultiva-se, fazendo significar cada momento que nos proporcionam e retribuindo, da melhor forma possível, esse sentimento aos outros.

É assim que quero Gratus Esse.

"A vida não pode existir em sociedade senão através de concessões recíprocas."

Johnson, Samuel


Uma afirmação que apesar de parecer trivial, do senso comum, carrega em si um significado muito importante. Apercebi-me que é facil aplicar esta realidade num contexto massivo, como as sociedades civis em que vivemos; mas torna-se bem mais complexo aplicá-la num contexto bem mais pequeno, como as famílias. Não por falta de requisitos ou aplicabilidade mas porque num contexto mais pequeno temos a tendência natural e involuntária de nos tornar-mos cegos; não ás concessões que nos são dadas mas á reciprocidade daquelas com que retribuímos. E este, meus caríssimos, é um comportamento que eu considero perigosamente próximo da ganância que eu tanto abomino.
Espero eu reconquistar a lucidez que me permita distanciar-me de voltar a ajuízar em prejuízo de alguém, quanto mais para meu beneficío próprio.
Nego-me, porque acredito neste princípio, a liberdade de contribuir para a desedificação dos valores e das mentalidades altruístas que povoam a história da humanidade


A VIDA é aquilo que fazemos com o TEMPO que nos é oferecido.

O tempo é um grande mestre; tem porém o defeito de matar os seus discípulos.

Berlioz, Hector in "Almanaque das Letras".


Na verdade, os ensinamentos provenientes dos elementos responsáveis pela formação das nossas personalidades ao longo da nossa curta vida, como a família e a sociedade, não são mais do que os degraus onde firmamos a nossa personalidade e através dos quais vamos construindo a nossa sapiência.

Chegados ao final da nossa vida, damos conta que as verdadeiras lições não se aprendem porque os nossos pais nos castigam quando mentimos, ou quando somos expulsos da escola porque agredimos, verbal ou fisícamente, um professor nem mesmo quando cumprimos uma pena de 25 anos de prisão porque matámos o caixa da loja de conveniência que assaltamos; Não! A verdadeira lição é ou não aprendida, mediante a capacidade de distinguir o bem do mal. Esta distinção deve ser conseguida durante a construção do carácter de cada indivíduo. Quando este processo falha, cria-se um distanciamento, entre o indivíduo e o meio em que se insere. Quanto maior for este distanciamento, maior será o fracasso enquanto pessoa social.

Este é um processo que acompanha a longevidade do ser humano. E com isto pretendo ratificar, em absoluto, a afirmação proferida por Hector.

Àqueles que morrem prematuramente; é-lhes negado o direito redenção; estes serão sempre, em última análise, as verdadeiras vitímas do TEMPO.

Ou sais tu, ou saio eu.

Por defenição, Suicídio é:
Acto ou efeito de suicidar-se; morte dada a si próprio; ruína ou desgraça provocada pelo próprio por falta de juízo.
Enquanto por juízo entende-se:
O acto mental de asseverar (afirmando ou negando) um conteúdo afirmável.
Uma questão:
Será lícito afirmar que quem comete suicídio tem necessáriamente falta de juízo?
À luz da defenição, não será seguramente.
Mas o meu problema é de outra índole. Receio ter chegado a um ponto em que todas estas questões ocorrem a um nível intermédio entre o consciente e o inconsciente. Para mim só uma pessoa com grande coragem comete, efectivamento, o acto de suicídio. Ora, na posse das minhas faculdades intelectuais e sabendo, ou sentindo se quiserem, que não tenho motivos para cometer tal acto, pergunto-me o que aconteceu. Não me conheço eu a ponto de transformar o meu comportamento perigoso para mim próprio? Preciso ter medo de mim próprio? Atentei eu contra a minha própria vida?
Neste momento, ainda não tenho resposta para nenhuma destas questões...
Na certeza porém de que ou sai esta sensação ou vou acabar por sair eu...

Imortalidade, como eu te quero.

"Morro aos poucos em todos aqueles que gostam de mim "

Rosseau, Jean Jacques.

Nesta peça de Teatro que é a vida,
Não quero sentir que em vós rasgo as páginas do guião onde se conta a minha história,
Não quero ser interpretado como aquele de quem tanto lamentaram,
Não quero ver descer o pano,
Não quero ver partir a plateia em desagrado,
Quero figurar no vosso livro de memórias,
Quero povoar os sonhos de que tanto se orgulharam,
Quero sair de cena quando a peça faz um ano,
Quero sentir que estive cá, e sou saudado.
Rocha, José Holbeche